segunda-feira, 12 de julho de 2010

VERGONHA

Gabriela Mistral

Se tu me olhas, eu me torno formosa
como a erva a quem desceu o orvalho,
e desconhecerão minha face gloriosa
as altas canas quando baixe o rio.
Tenho vergonha de minha boca triste,
de minha voz rota, de meus joelhos rudes;
agora que me olhaste e que vieste,
me percebi pobre e me toquei desnuda.
Nenhuma pedra no caminho achaste
mais despida de luz na alvorada
que esta mulher a quem levantaste,
porque ouviste seu canto, o olhar.
Eu me calarei para que não conheçam
minha ventura os que passam pelo campo,
no fulgor que há em minha face tosca
e no tremor que há em minha mão...
É noite e desce à erva o orvalho;
olha-me fundo e fala-me com ternura,
que de manhã, ao descer ao rio
a que beijaste levará formosura!

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